sexta-feira, 30 de abril de 2010

Revisão da matéria dada



A primavera faz-nos bem.
Deixa-nos tremendamente às avessas com o tempo mas ainda assim sabe muitíssimo bem: no pacote tanto ficaram incluídas as semanas de mantos de chuva interminável mas também os de sol e calor profundamente abrasador. Principalmente estes últimos. Daquele calor inesperado que um dia acordas e sais para uma manhã e finalmente podes estrear aquela camisa (tão boa, tão fresca) de manga curta que estava já esquecida no fundo da gaveta; à tarde torramos, cerramos os olhos com a claridade e damo-nos temporariamente por vencidos junto a uma sombra fresca. Mas no meio disto tudo o que mais prazer dá ainda são os finais de dia: caramba, são sete da tarde e há ainda uma deliciosa luz como se fosse de há duas horas atrás e uma nostálgica brisa amena junto à roupa. É quase como um baque inesperado. Fico com a sensação que podia ficar a passear toda a noite em serão de manga curta, que podia apanhar inesperadamente o comboio (não houvesse greve aliás) e ficar na praia nem que fosse apenas de pé descalço.

Ao mesmo tempo dou por mim em vésperas e Maio. Maio?! Como raio é que eu cheguei a Maio? Quando é que isto aconteceu? E onde é que eu estive no meio disto tudo? Paro um pouco para analisar a situação: o ritmo das coisas tem sido verdadeiramente rápido, sequencial e muitas vezes quase nervoso. Atrevo-me a dar a primeira espreitadela por detrás do ombro. A resposta à segunda questão é relativamente simples: foram nove meses. Espanto absoluto. Nove meses?! Nove meses é mais de meio ano, é uma gestação completa. A primeira pergunta impõem-se então novamente com redobrado sentido: como é que isto aconteceu?
A sensação que permanece é a de que eu não tive a mínima noção desta passagem do tempo, a não ser de um modo muito pragmático e relativo (é natal? porreiro. carnaval? fixe. páscoa? amén). No entanto, dou-me agora ao luxo de olhar para o meu último ponto de referência, o secundário, e pensar finalmente um pouco nisso.

É um abismo.

Não sei, a ideia que me dá é que isso aconteceu há séculos e não há um ano atrás. Estranhíssimo. Como se fixássemos o ponto de partida no horizonte e nem nos lembrá-se-mos de como tínhamos cá vindo parar. E penso que é nesta altura que começamos a contar as mudanças: pessoalmente nem sei se hei-de ficar assustada com o que mudou ou com o que ficou na mesma. Às vezes, há coisas que parecem ter uma importância brutal e às vezes essas mesmas coisas passam já a ser parte de nós - adoptamos a filosofia do venha o que vier mas talvez um pouco mais leves. Reavalio relações e maneiras de estar. O tempo é brutalmente menor, eternamente em falta, e o trabalho inversamente proporcional (e mesmo assim não me posso queixar muito). Paradoxalmente há também uma série de coisas que faço muito menos: dei por mim a apanhar em final de almoço a menina V. e a confessar-lhe que não tenho lido, nem escrito e (mentalmente) desenhado e fotografado muito menos - procrastino dez vezes mais. Já quanto ao curso, finalmente começo a ter uma ideia do que é Design de Comunicação verdadeiramente: com a noção que de facto sabia mesmo muito pouco no que me estava a meter quando comecei, que até estou a gostar da jornada (a sério), mas cada vez mais com a nuvem se esta será mesmo a minha praia.

A primavera e o início abrupto de Maio dão-me, em suma, os primeiros momentos para reflectir a sério e olhar para trás. Julgo que esta minha constante surpresa está presa ao facto de eu continuar a considerar-me muuito lentamente e com muuita relutância a rapariga de faculdade que tem de se levar a sério.
Já estivemos mais longe disso.


(Desculpem um post pesado, apenas para lembrar que no meio desta porcaria toda de trabalho há ainda o prazer do carro das castanhas substituído - literalmente - pelo carro dos gelados, os bons serões de tarde e trocas de copos entre amigos que cá se vão arranjando pelo meio, de boa música que se vai descobrindo e de um ou outra loja de chocolates, ou sushi, ou o que seja, de chorar por mais que se encontra na baixa. A sério, a primavera faz-nos mesmo muito bem. Imagem do grande zeruch http://zeruch.deviantart.com/)

Sem comentários:

Enviar um comentário